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Agora

, mais do que nunca, precisamos realizar mais e melhor

Paulo Roberto Guedes | Consultor Associado da Sociedade Faria de Oliveira Advogados | Agosto de 2023

Tenho ficado desanimado e razoavelmente desiludido, pois a complexidade dos problemas nacionais, quiçá de todo o mundo, é de tal ordem e envergadura que exigiria um conjunto de soluções políticas, econômicas e sociais, muito mais profundas e estruturais do que se tem visto nas discussões que se apresentam atualmente. Mais notadamente no Brasil.

Talvez por ignorância, desconhecimento, imprecisão histórica ou até mesmo má-fé, a abordagem, quase sempre feita a partir de premissas irreais e incorretas, tem resultado em diagnósticos superficiais, no mínimo incompletos, e que não atingem sequer o cerne das questões. E com diagnósticos malfeitos passa-se “ao longe” das efetivas e concretas soluções.

Esses não são, evidentemente, problemas novos, tanto que tenho sido ‘levado’, já há algum tempo, a escrever artigos que tratam, direta e indiretamente, desses temas.

Minhas tentativas têm o objetivo de esclarecer que a “ciência econômica é meio cujo fim maior pode ser resumido pela busca do bem-estar universal da sociedade no que diz respeito ao atendimento de suas necessidades básicas (pelo menos) de bens econômicos e serviços. Implícito está, portanto, criar condições para que todos os cidadãos, além de participarem do processo de produção também participem, via justo processo de distribuição, do respectivo consumo. E mais, que as classes dirigentes, a partir e principalmente do próprio governo, uma vez compreendidos os fenômenos econômicos do mundo real, no qual as imperfeições de mercado estão presentes, e das leis ou teorias formuladas, têm totais condições para desenvolverem e estabelecerem, via Programas e Políticas Econômicas, normas de comportamento que busquem respostas eficazes para os problemas econômicos existentes na sociedade”.

Tenho procurado, inclusive, esclarecer que mesmo diante de formas diferentes de se conceituar a ciência econômica, uma característica comum sempre foi a aceitação de que o conjunto de estudos que se faz sobre os fenômenos econômicos de qualquer sociedade, define-a como uma ciência social. Como tal, relacionado ao comportamento da sociedade, em geral, e do ser humano em particular, com todas as características inerentes, entre elas, a da irracionalidade de seus atores durante o processo de tomada de decisões.
Consequentemente, percebe-se que os estudos econômicos não podem estar limitados ao alcance da eficiência produtiva, principalmente quando for em detrimento de outros objetivos tão importantes, como é o caso de se buscar a melhor forma de distribuir a produção dos bens e serviços produzidos, posto que é essencial manter cidadãos justa e corretamente recompensados, seja como consumidor, seja como produtor.

A partir desse entendimento (o ‘comportamento’ do ser humano, em todas as suas características, tem importância fundamental no ‘comportamento’ da sociedade, incluindo-se aí, a própria economia), é de se imaginar já ter passado o tempo no qual os estudos econômicos consideravam, quase que exclusivamente, premissas que tinham como base a racionalidade do ser humano nas decisões relativas às atividades econômicas.

E se nas análises relativas aos assuntos econômicos jamais deveremos considerar os seres humanos como atores racionais, posto que dificilmente agem assim, deveria ficar claro para todos que mercados não funcionam de “forma perfeita”, considerando-se que seus principais atores - pessoas, empresas e países -, além de não atuarem de uma forma eficiente, ainda são, como aqui já escrito, irracionais, na medida em que se orientam, inclusive, por “outros valores’, políticos, sociais, religiosos e culturais.

Portanto, parece óbvio que os estudos econômicos proporcionam uma forma importante para se compreender o mundo, mas essa compreensão se dará de forma muito mais rápida, melhor e mais fidedigna se também nos socorrermos dos conhecimentos proporcionados por outros ramos das ciências que contemplam esses ‘outros valores’.

Não há qualquer dúvida que o ‘mundo real não produziu’ o que dele se esperava, posto que as promessas de prosperidade, de crescimento sustentável, de equilíbrio fiscal e de diminuição da desigualdade não se concretizaram na rapidez e com a eficácia desejadas. Como resultado, as perspectivas futuras das populações mais pobres, de todo o mundo, foram se ‘perdendo no tempo’, aumentando a tensão e os questionamentos que têm colocado, inclusive, a própria democracia em risco.

É bastante claro, portanto, que assuntos relacionados às mudanças geopolíticas, ao aumento da concentração de renda e da desigualdade, ao futuro da globalização, à transição energética, à mudança climática, à saúde, à educação e ao aumento da violência, não são novos e já vem ocupando, talvez sem a ênfase que se deseja, a agenda de todos. Os eventos recentes, pandemia e invasão da Ucrânia, apenas demonstraram, de forma clara e transparente, quanto o mundo em que vivemos atualmente está desprotegido, vulnerável e vivendo realidades diametralmente antagônicas.

É certo que o mundo todo, em face das atuais circunstâncias e pelo que vem sofrendo nas últimas décadas, muito precisará realizar para minimizar os efeitos maléficos gerados. Aliás como já escrevi (“Os problemas do mundo, a geopolítica e as corporações empresariais”, artigo publicado dia 10.06.22 no Guia do TRC), o momento atual “exigirá que se adotem, pelo menos e de forma inquestionável, seis providências fundamentais: a) aumento da geração de empregos e diminuição dos níveis de desigualdade; b) aumento da cooperação entre países; c) pressão para que as grandes empresas de tecnologia e os governos nacionais estabeleçam um processo comum para “governança da privacidade de dados, do uso seguro e ético da inteligência artificial e da segurança cibernética”; d) incentivo para que as empresas, via um “olhar mais holístico”, se ocupem e iniciem estudos geopolíticos que lhe correspondam; e) preparação da sociedade mundial para o enfrentamento de eventos desse tipo, posto que ocorrerão em futuros cada vez mais frequentes; e f) aumento dos investimentos para a efetiva substituição dos sistemas energéticos atuais, por outros de menor impacto ambiental (buscar efetiva e concretamente a “economia de zero carbono”).

Indiscutivelmente, portanto, é necessário que todos ‘despertemos’ para problemas desse tipo que, como se vê, extrapolam as fronteiras empresariais ou de uma só nação, e implicam em decisões de caráter geopolítico. São temas que afetam a humanidade e o mundo como um todo, não podendo se limitar, ainda que separadamente, às discussões acadêmicas, científicas, tecnológicas, empresariais ou governamentais.

Foi com extrema alegria, portanto, que ao ler o livro de Klaus Schwab e Peter Vanham (“Capitalismo Stakeholder – Uma Economia Global que trabalha para o progresso, as pessoas e o planeta”, editora Alta Cult, 2023) percebi o quanto todos nós precisamos trabalhar para que, “em um mundo no qual o pessimismo é cada vez mais a ordem do dia, e o interesse próprio e em curto prazo ainda é atraente”, seja construída uma “economia mais resiliente, inclusiva e sustentável”.

Caberá aos governos, neste modelo de “capitalismo stakeholder”, trabalhar para que se alcance uma “prosperidade equitativa”. Isto é, na qual “qualquer ator individual maximize sua prosperidade, mas de um modo que seja equitativo para as pessoas e o planeta”. Nesse sentido os governos deverão: 1º) “valorizar as contribuições de todos à sociedade, dar oportunidades iguais para todos e diminuir quaisquer desigualdades excessivas que surgirem” (educação, saúde, moradia e conectividade); 2º) “agir como um árbitro e regulador de empresas operando no livre mercado”; e 3º) “como guardião de gerações futuras deve impedir as atividades que degradam o meio ambiente”.

Vale aqui, reproduzir um trecho que representa parte das conclusões de Schwab e Vanham: “aquele tempo no qual uma organização tinha apenas seu próprio interesse em mente e o seguia sem considerar os interesses de seus ‘stakeholders’ acabou. Em uma sociedade tão interconectada e na qual o sucesso de cada ator depende de grande conectividade e interação com tantos outros atores, decisões só podem ser tomadas se houver um resultado positivo para o sistema inteiro. Para empresas isso significa, especificamente, que os ventos da história soprarão no rosto daqueles que se prendem ao conceito de primazia ‘shareholder’. Mas serão ventos favoráveis para aqueles que reconheceram os sinais e pratica o ‘capitalismo stakeholder’ “.

Se como dizem Schwab e Vanham, “os sistemas atuais falham ao ignorar muitos dos problemas que enfrentamos atualmente”, está na hora de se buscar respostas mais “holísticas”, que envolvam “governos, empresas e indivíduos”. É imprescindível que se busque um novo “contrato social” no qual as responsabilidades estejam compartilhadas.

Quem tem acompanhado as reuniões do Fórum Econômico Mundial, do qual Klaus Schwab é seu fundador e presidente, sabe que além das preocupações com o meio ambiente e os conflitos entre nações, um dos assuntos que mais tem chamado a atenção é o que aqui já se escreveu: a desigualdade e a forma injusta como são distribuídos os bens econômicos e serviços produzidos.

E quanto a isso não há novidade, pois todos sabemos que processos contínuos de concentração de renda aumentam a desconfiança e a desesperança, gerando descrédito com a política e os poderes constitucionais estabelecidos, sejam eles quais forem. E com movimentos sociais mais ativos, as buscas por soluções inovadoras testarão, de forma cada vez mais contundente, a geopolítica mundial e todas as sociedades. O Brasil, como de resto todo o mundo, precisa se atualizar a respeito e procurar fazer “as coisas” de forma diferente do que se fez até agora. E, principalmente, melhor!

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