Comprar ou vender serviços logísticos exigem competências específicas
Paulo Roberto Guedes | Consultor Associado da Sociedade Faria de Oliveira Advogados | Agosto de 2021
Em artigo publicado em abril de 2019 (site da Tecnologística: “Além do preço, a contratação de serviços logísticos exige avaliações que considerem a relação “custo / benefício”), ao comentar o crescimento da terceirização dos serviços logísticos em todo o mundo, observei que tanto os operadores como os tomadores de serviços compreenderam, já há algum tempo, que a venda ou a aquisição desses serviços exige postura e processos diferentes daqueles normalmente utilizados na venda ou na compra de “commodities”. Isto não quer dizer, necessário lembrar, níveis diferentes de importância ou de prioridade, posto que ambos – “commodities” e serviços logísticos - constituem parte do imenso universo de bens econômicos e serviços, diariamente produzidos, imprescindíveis à vida e ao funcionamento de qualquer sociedade.
Porém, significa dizer que a venda e a compra de serviços logísticos devem ser realizadas de forma apropriada posto que, ao contrário das “commodities”, os serviços logísticos exigem competências específicas e aplicadas na solução de operações complexas, diferenciadas e que, necessariamente, precisam ser desenvolvidas para cada cliente. E de preferência, juntamente com ele.
E se serviços logísticos exigem desenvolvimento e soluções personalizadas (“customizadas”), adaptadas às exigências e necessidades de cada cliente e que visam soluções específicas, não há receita única, uma vez que é necessário respeitar, também, as características de cada produto, de cada região e de cada mercado. São serviços que diferem uns dos outros, principalmente considerando as diversas alternativas estratégicas que cada cliente empreende ao seu negócio.
Enquanto no mercado de ‘commodities’ o preço tem que ser o mais competitivo possível, uma solução logística estabelece seu preço baseado no projeto elaborado, isto é, e como já comentado no artigo citado, considerando a relação “custo / benefício”. A palavra-chave, portanto, é “agregar valor” e o relacionamento entre ambos, tomador e prestador de serviços, deve ocorrer em clima de cordialidade e intimidade, nas quais a confiança, o comprometimento e a lealdade são valores indiscutíveis. A terceirização logística somente ocorrerá se o tomador desses serviços tiver certeza que o operador a ser contratado, além da capacidade operacional e dos conhecimentos técnicos exigidos, tem condições de entender e respeitar a cultura, os costumes e os ‘tempos’ do cliente, assim como das demais empresas que compõem a sua cadeia de fornecimento, abastecimento ou distribuição.
Contratantes e contratados compartilham, consequentemente, prêmios e insucessos e correm os mesmos riscos por todo o período no qual a parceria se mantem. Essa parceria – sem o desgaste que a palavra teve nos últimos tempos – é fundamental, já que a necessidade de se prestar e receber serviços com qualidade e que atendam exigências contratuais acordadas entre ambos, é um compromisso mútuo, exigido diária e ininterruptamente enquanto o contrato for vigente. Não se trata, portanto, de um lote definido e acabado de um produto, mas sim a prestação diária de um serviço que assume, para ambos, importância estratégica.
Considerando que a terceirização de serviços logísticos veio para ficar, é imperativo que o prestador de serviços ao elaborar uma proposta, acima de tudo resiliente, nestes tempos de frequentes e profundas mudanças, prepare-se para o futuro, pois opera em um segmento de mercado extremamente diferenciado e com enorme multiplicidade de exigências, mais complexas e sofisticadas e nas quais a inovação tecnológica é imprescindível. Sempre buscando eficácia na sua aquisição, ao tomador desses serviços exigir-se-á, adaptação ao novo mercado e modernização de seus processos de compra, seleção e contratação.
De qualquer forma, ao se decidir terceirizar essas atividades, alguns entendimentos o tomador de serviços logísticos precisa ter. Por exemplo:
• Nem sempre, no dia-a-dia, o operador logístico conseguirá manter os níveis de qualidade estabelecidos nos contratos;
• Em diversos momentos ele estará sem sugestões de melhorias e com pouca criatividade consultiva;
• É possível que em alguns momentos o operador poderá ter dificuldades para se manter atualizado, notadamente com relação aos avanços tecnológicos;
• O operador poderá, em determinados momentos, ter sua capacidade gerencial aquém das necessidades da operação;
• O operador logístico, em face de diversas circunstâncias, poderá não realizar exatamente o que foi prometido, principalmente no que diz respeito a custos;
• Nem sempre será fácil construir um relacionamento duradouro e confiável.
Portanto não é à toa que os processos para selecionar um operador logístico, cada vez mais rigorosos, compreendem um razoável conjunto de itens. E uma vez terminado o processo de seleção, muito há o que se fazer para que se tenha um contrato que reflita, correta, fiel e com justeza, os serviços a serem prestados. Entre outros, alguns itens que jamais devem ser esquecidos:
• Elaborado sempre em conjunto com a área jurídica e periodicamente revisado;
• Com definição clara do escopo e das obrigações de contratante e contratado;
• Com fluxo operacional e aspectos estruturais relevantes explicitados;
• Com cronograma de todo o processo de implantação e um programa de comunicação competente;
• Com programa de gerenciamento de riscos e de proteção ao meio-ambiente e correspondentes coberturas de seguro;
• Com níveis de serviços e de segurança acordados;
• Com indicadores de desempenho e relatórios de acompanhamento definidos;
• Com programas de melhoria contínua e ganhos de produtividade;
• Sem que se coloque em risco a continuidade das operações, com procedimentos claros de premiações e penalidades;
• Com planos de contingência;
• Com preços, condições de reajustes, de faturamento e pagamento claros; e
• Com rigorosos programa de auditorias.
Pesquisas realizadas por institutos de renome, e em todo o mundo, têm demonstrado que o prestador de serviços logísticos pode vir a ser um grande parceiro e que a terceirização logística, quando feita de forma estratégica, não só libera energias para que as empresas se dediquem com mais foco aos seus próprios negócios, como também ajuda no aperfeiçoamento das atividades de “supply-chain management”.
Se terceirizar é preciso, tomar os devidos cuidados com os processos de compra, seleção e contratação do operador logístico, entendendo-o como uma empresa que opera sob medida (“tailor-made”), é pressuposto fundamental e imprescindível.